Rogaciano Leite

A Iara

Rogaciano Leite
(Lenda amazônica)

Deslumbrante, formosa, despida,
Seios róseos, a trança descida
Sobre as curvas do corpo macio,
Aos eflúvios de noite bem clara
Sedutora dirige-se a Iara
Ao caboclo — que pesca no rio.

Tinha os dedos de pérolas cheios
E trazia na concha dos seios
Algas finas, cristais multicores…
Como grampos de estrelas na fronte
Vivas faixas de estranho horizonte
Cintilavam... lançando esplendores!

Das mãos finas, do colo, das pernas
Acendiam-se-lhe áureas lanternas
Projetando florões luminosos;
E a vertigem das chispas trementes
Coloria-lhe o jaspe dos dentes
E a papoula dos lábios formosos.

Era linda!... Trazia ao pescoço
Mil colares de líquido esboço,
Róseos, verdes, azuis, movediços…
Sobre a cinta, cobrindo-lhe o sexo,
Raios loiros de fino reflexo
Transformavam-se em meigos feitiços!

Quando os dedos num gesto movia,
Entre as mãos uma rosa se abria
Exalando perfume distinto;
Se do lábio descia o contorno
A carícia de um hálito morno
Incensava da selva o recinto.

Tinha os pés pequeninos, macios
Como a espuma que à margem dos rios
Desce, à toa... boiando... luzindo…
Fascinante, gentil, envolvente,
Surge à vista do bugre indolente,
Inebria-o de luz — e vem vindo…

Do caboclo que está descuidado
Deita o braço ao pescoço queimado
E nos seios aperta-o, após;
Arrancando-o à margem do solo
Sob as tranças aninha-o no colo
E nas águas mergulha... veloz!

………………………………………

Oh! ditoso caboclo da selva
Que vivias sentado na relva
Suspendendo nos dedos o anzol!
Aos encantos de noite bem clara
Embalado no colo da Iara
Vais, caboclo, tostado de sol!

(Recomposição de um improviso).